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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Em nome do Pai

Em nome do Pai

Em nome do Pai proibimos tantas coisas e podamos tantos caminhos. Em nome do Pai muitas vezes massacramos os irmãos e em vez de formá-los, os deformamos. Em nome do Pai construímos sistemas nos quais aprisionamos, castelos onde isolamos, catedrais e conventos onde excluímos.
Matamos em nome do Pai. Cercamos, muramos, proibimos. Fazemos uma prece em nome do Pai com o nosso nome. Desconhecemos os irmãos em nome do Pai, defloramos as irmãs em nome do Pai.
O assombro da noite escura, tenebrosa e cega, espalhamos em nome do Pai. Pisamos no jardim que o irmão plantou, arrancamos suas raízes, salgamos o chão com ranço fratricida da disputa, tudo em nome do Pai.
Tolhemos o amanhã, enterramos os talentos e apagamos as chamas tênues, tudo em nome do Pai. Esquecemos o passado, delatamos as lembranças de outrem, confessamos os pecados alheios, em nome do Pai. E quanta amargura vertemos nas taças dos outros em nome do Pai!
Comemos o pão que o pobre plantou e que não comeu, debulhamos o trigo que não semeamos, guardamos o fruto da videira que não cuidamos, para vendê-los por um bom preço, na celebração mercantil nossa de cada dia, em nome do Pai.
Pisoteamos o sal e escondemos a luz dos irmãos para que sejamos notados pelo Pai. Empurramos o trôpego, embebedamos mais ainda o bêbado, e entornamos seu fermento na lama, como Caim, encharcado de vermelho, que certamente não é do vinho da fraternidade.
A fome campeia, a sede seca e a violência mata nos campos do Pai, como se sua vontade fosse. A triste melodia ecoa por ouvidos indiferentes à voz do Pai, e para não ouvi-la, cantamos nossas canções e hinos profanos no mais alto dos tons, em nome do Pai.
O mendigo pede em nome do Pai o que lhe é de direito por herança legítima. Indiferentes, comemos e bebemos como se fôssemos filhos únicos. Alardeamos através de todos os ventos e sobre todos os mares a grandeza e a magnificência do Pai, compomos odes em seu louvor, como se lhe acrescentassem algum milímetro sequer, mas esquecemos de acudir o irmão e a irmã, que se tornaram invisíveis para nós.
Em nome do Pai colocamos mais cruzes nos ombros dos irmãos, penduramos sobre elas nossas mazelas, nossos recalques e nossa desesperança, para que ele as carregue sozinho. Como se não bastasse o calvário da sobrevivência de cada dia, impomos nossa vontade aqui na terra como se fosse dos céus, e se não perdoamos as ofensas de ninguém, perdoamos as nossas mesmas em nome do Pai.
Celebramos a eucaristia ao Pai com a consciência tranquila, tranquila, como se fôssemos os melhores irmãos do mundo e os filhos mais amorosos que um pai pudesse desejar.
Esquecemos (ou escondemos) de mostrar o carinho do Pai. Um Pai amoroso e incansável em procurar a felicidade de todos os seus filhos e filhas, que transborda de misericórdia e compaixão, que se alegra até com um simples copo d’água que é dado em seu nome a um desses filhos pequeninos. Esquecemos de dizer que é um Pai que não gosta de ser chamado de ‘senhor’ e que não suporta ouro, prata nem diamantes, mas que move todo o universo para atender uma lágrima de súplica de um menino de rua.
Ao amigo e irmão D. Fernando Saburido, na sua profética missão pastoral de reconstruir a unidade, no amor fraterno.

Assuero Gomes
Médico e Escritor





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