Ainda sobre o parto vaginal e a cesareana
É interessante observar esse texto científico sobre o assunto.
Os estudos sugerem que a asfixia intraparto e, em
conseqüência, a morbimortalidade fetal e neonatal se devem a falhas em
reconhecer o risco de sofrimento fetal e atuar de modo apropriado e em tempo
hábil, o que exigiria adequada monitorização do batimento cardíaco fetal,
avaliação do peso fetal e da idade gestacional, observação da quantidade e tipo
de líquido amniótico, acompanhamento da duração e eficácia do trabalho de parto
25 30 61 62 63 64 65 66 67. Gemelaridade, crescimento
intra-uterino retardado, apresentação fetal anômala, distorcia, segundo período
do trabalho de parto prolongado, oligoâmnio, presença de mecônio no líquido
amniótico, corioaminionite, amniorrexe prematura são algumas condições
identificáveis no período intraparto que aumentam o risco de mau prognóstico
neonatal3 67 68. Nessas condições, o parto deve ser realizado em
unidade capaz de oferecer monitoramento intraparto com cardiotocografia e, pelo
risco aumentado de asfixia intraparto, é preciso ser mais tolerante quanto à
realização de cesárea 15 37 45 47 51 66 69.
Em uma recente revisão de literatura, Hankins e colaboradores[G1] ,
com o objetivo de determinar o impacto sobre a morbimortalidade neonatal se
fosse permitido às mães optarem por realizar cesárea eletiva às 39 semanas de
gestação, apresentou resultados estarrecedores, que comprometem a prática e a
cultura obstétrica atual; por exemplo, estimou que a cesárea em mulheres nessa
idade gestacional, antes de entrarem em trabalho de parto, reduziria em 80% as
ocorrências de encefalopatia moderada ou grave, o que, apenas nos Estados
Unidos, evitaria 9.462 novos casos por ano 70[G2] .
Nesse sentido, Liston e colaboradores analisando 147.100
nascimentos no Canadá, revelaram que a cesárea em gestação a termo diminuiu em
66% os traumatismos fetais maiores (uma ou mais
fraturas, paralisias, hemorragia intraventricular) e, em 20%,
os menores, como os cefalohematomas71[G3] .
Em contrapartida, um dos mais
significativos estudos de coorte prospectivo, realizado por Kola°s[G4] e colaboradores, avaliando 18.653 partos na Noruega, revelou que a cesariana
planejada resultou em risco duas vezes maior para internação em UTI neonatal,
principalmente por problemas respiratórios neonatais, comparado ao parto
vaginal planejado, mesmo quando ajustado para a diferença de idade gestacional
e que tais problemas respiratórios neonatais são mais comuns quando a cesariana
é realizada antes do início do trabalho de parto72[G5] .
Tais achados sugerem que uma política arbitrária de cesárea eletiva poderia acarretar
um risco maior de morbidade neonatal iatrogênica e aumento do custo hospitalar.
Por outro lado, esse estudo não foi estatisticamente significativo para avaliar
as repercussões neurológicas e revelou que, para bebês com idade gestacional ≥ 39
semanas, não houve, para os problemas respiratórios, diferenças nos resultados
entre cesárea e parto normal; também conclui
que em muitas situações o estresse do parto vaginal, para as crianças, é muito
superior, o que imporia uma cesárea eletiva com mais presteza.
Do lado materno, conforme um grande estudo de base
populacional realizado por Liu e colaboradores no Canadá, comparando a cesárea
planejada com o parto normal, revelou taxas globais de morbidade materna grave
de 27,3 e 9,0 por cada 1000 partos, respectivamente; com risco relativo maior,
para as que fizeram cesarianas, de parada cardíaca materna, troboembolismo,
histerectomia e infecção puerperal73[G6] .
Contudo o risco absoluto para as morbidades graves foi baixo, por exemplo, para
a parada cardíaca, o aumento com a cesárea planejada foi de 1,6 por 1000
partos. A diferença da taxa de morte hospitalar entre os dois grupos não foi
significativa.
Levando em conta as taxas adequadas de cesárea em
nível populacional, Lawn e colaboradores em um estudo que incluiu 193 países60[G7] , após classificá-los
em 5 categorias por taxa de mortalidade neonatal, o grupo de mortalidade
neonatal muito baixa (≤ 5) teve uma taxa média de cesárea de 17% e o grupo
mortalidade com muito alta (>45) teve uma taxa média de apenas 3%. Contudo,
o que se verifica na literatura é que, mesmo com taxas de cesárea maiores de
20%, nenhuma associação foi observada entre as taxas de cesáreas de países de
alta renda e a mortalidade neonatal ou materna. No entanto, o mesmo não
acontece com países pobres, pelo contrário, uma taxa maior de cesárea melhora
os resultados maternos e neonatais, sendo os resultados piores quando a taxa se
encontra abaixo de 10% 49[G8] .
Evidentemente que o aumento de cesáreas tem um custo financeiro, por exemplo,
um levantamento realizado em maternidades européias revela que, em média, os
custos da cesárea são duas a três vezes maiores do que os do parto normal
cefálico, o que, em situação de limitados recursos, obriga à utilização dos
melhores critérios na sua eleição72[G9] .
[G1]Gary D. V. Hankins, Shannon M. Clark, and Mary
B. Munn. Cesarean section on request at 39 weeks: impact on shoulder dystocia,
fetal trauma, neonatal encephalopathy, and intrauterine fetal demise. Semin
Perinatol. 2006 Oct;30(5):276-87.
[G2]Gary D. V. Hankins, Shannon M. Clark, and Mary
B. Munn. Cesarean section on request at 39 weeks: impact on shoulder dystocia,
fetal trauma, neonatal encephalopathy, and intrauterine fetal demise. Semin
Perinatol. 2006 Oct;30(5):276-87.
[G3]F A Liston, V M Allen, C M O’Connell and K A
Jangaard. Neonatal outcomes with caesarean delivery at term. Arch Dis
Child Fetal Neonatal Ed 2008;93:F176–F182.
[G4]Toril Kola°s, Ola D. Saugstad, Anne
K. Daltveit, Stein T. Nilsen, Pa°l Øian. Planned cesarean versus planned vaginal delivery at
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Obstetrics and Gynecology (2006) 195, 1538–43.
[G5]Toril Kola°s, Ola D. Saugstad, Anne
K. Daltveit, Stein T. Nilsen, Pa°l Øian. Planned cesarean versus planned vaginal delivery at
term: Comparison of newborn infant outcomes. American Journal of
Obstetrics and Gynecology (2006) 195, 1538–43.
[G6]Shiliang Liu, Robert M. Liston, K.S.
Joseph, Maureen Heaman, Reg Sauve, Michael S. Kramer. Maternal mortality and
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planned vaginal delivery at term. CMAJ • February 13, 2007 • 176(4).
2.
[G7]Joy E. Lawn,
Mary Kinney, Anne CC Lee, Mickey Chopra, France Donnay, Vinod K. Paul, Zulfiqar
A. Bhutta, Massee Bateman, Gary L. Darmstadt. Reducing intrapartum-related
deaths and disability: Can the health system deliver? International Journal of
Gynecology and Obstetrics 107 (2009) S123–S142.
[G8]Althabe F, Sosa C, Belizán JM, Gibbons L, Jacquerioz F, Bergel E. Cesarean Section Rates and Maternal and Neonatal Mortality in Low-,
Medium-, and High-Income Countries: An Ecological Study. Birth. 2006
Dec;33(4) :270-7
[G9]RCOG. Clinical Guideline - Caesarean section. Royal
College of Obstetricians and
Gynaecologists, London ,
2004.
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